Visita ao Fórum Fazendário de Joinville em agosto de 2025

Redução da jornada é medida urgente para enfrentar o adoecimento e oferecer qualidade ao serviço judiciário

Em um contexto de cobrança excessiva por produtividade, metas e adoecimento dos servidores e servidoras, o SINJUSC coloca em pauta uma reivindicação histórica: a redução da jornada de trabalho de 7 para 6 horas diárias. A proposta vai além de uma conquista: ela é fundamental tanto para a qualidade do serviço público quanto para garantir qualidade de vida de quem faz o Judiciário funcionar.

A luta pela redução da jornada surge como resposta direta a uma cultura que tomou conta das comarcas a partir da política de metas imposta pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Desde 2004, quando a Reforma do Judiciário propôs enfrentar a morosidade dos processos, a pressão por produtividade projetou um cenário em que a alcançar rankings e selos virou prioridade em detrimento da finalidade principal do serviço: julgar conflitos e garantir direitos.

O problema é que a estrutura funcional não acompanhou o movimento. “É como se a instituição tivesse passado por um rebranding, um processo de ‘reposicionamento de marca’, semelhante ao que acontece em empresas privadas. Só que não houve contratação proporcional de servidores ou reforço nas condições de trabalho. O resultado é uma categoria sobrecarregada, adoecida, trabalhando sob intensa pressão”, afirma a Secretária de Estudos Socioeconômicos e Formação Sindical do sindicato, Jaqueline Maccoppi.

Esse quadro pode se agravar caso seja aprovada a proposta de Reforma Administrativa em discussão no Congresso Nacional. Esta não é a primeira vez que se tenta aprovar uma reforma administrativa, o texto atual promete precarizar ainda mais os vínculos e intensificar a cobrança por resultados, mais uma vez desconsiderando a estrutura existente: direitos dos trabalhadores e a demanda do serviço pela população. SAIBA MAIS

Sobrecarga, vigilância e adoecimento: a realidade nas comarcas

Visitas do sindicato às comarcas revelam um cenário preocupante. Servidores relatam pressão para trabalhar além do horário legal, inclusive levando serviço para casa, principalmente aqueles em cargos de confiança. Há também casos de controle excessivo, com gestores monitorando pausas, chegando ao caso extremo de controle do tempo gasto para ir ao banheiro. Denúncias de assédio moral muitas vezes resultam em represálias veladas, criando um ambiente de medo. “As consequências são depressão, ansiedade, Burnout. E isso não afeta só o servidor, afeta a qualidade do serviço que chega à população”, alerta Jaqueline.

Os relatos de exaustão proliferam pelas comarcas. Iolete de Jesus é servidora única numa equipe responsável por atividades diversas e complexas como as que compõem o estudo social dos processos das áreas de Família, Infância e Juventude, Criminal e Cível. Assistente social forense, lotada em comarca de Palmitos, desempenha inúmeras tarefas derivadas de atribuições que requerem intenso preparo emocional, como a proteção de vítimas de maus tratos, violência sexual, física e psicológica. Além disso, acumula ainda as demandas impostas pelas metas, registros no Eproc e SEUU (Sistema Eletrônico de Execução Unificado), entre outras atividades. “A sobrecarga me afeta diariamente, principalmente frente às novas tecnologias implantadas”, atesta.

A jornada se estende da manhã à noite e chega a oito horas, extrapolando a carga horária estabelecida. “Muitas vezes não é possível localizar os usuários e conversar com os profissionais da rede de atendimento, realizar reuniões, com conselho da comunidade, rede, grupo reflexivo de homens e outras atividades no horário do atendimento do judiciário”, relata. E ainda atende todas essas atribuições “com muito sorriso, serenidade e capacidade técnica”, assegura.

Após anos nesse cotidiano, percebeu que diversas vezes deixou de conviver com a família para se dedicar ao trabalho. “Sempre me organizei para me adaptar ao judiciário e as demandas do trabalho”.

O cansaço contínuo também é rotina para a servidora Joana*. O cotidiano acelerado pela tecnologia agrava as cobranças que partem também da população e dos advogados. “Sinto (o impacto) na saúde, nas dores do trabalho repetitivo, no sono, ansiedade, na visão. Quando chega final da tarde, os olhos estão cansados de tanta tela”, relatou à reportagem.

A otimização da tecnologia, dos sistemas de automatização de tramitação processual e a crescente adoção de ferramentas de Inteligência Artificial em curso são recursos que vem recebendo pouca atenção nas comarcas. Na opinião do TJA do Fórum Central, Wagner Luis Padilha, essas ferramentas devem servir para otimizar recursos e o tempo de quem as opera. “É justo e necessário que a economia de tempo desses processos seja utilizada para proporcionar uma melhor qualidade de vida aos servidores, com uma justa e necessária redução da jornada de trabalho”, acredita.

Redução da jornada: ganho para o servidor e para a população

A redução da jornada não é uma pauta da categoria, mas uma medida de inteligência para o próprio Judiciário. “Um servidor descansado, com tempo para cuidar da saúde, da família e da vida pessoal, trabalha melhor”, defende o sindicato. A medida pode significar mais qualidade no atendimento, mais atenção aos casos complexos e menos afastamentos por licença médica. 

Para Roberta**, que já precisou abrir mão de momentos importantes da vida pessoal em função da estafa, a redução da jornada teria um impacto transformador. “Daria mais qualidade de vida e de trabalho certamente”

Pressão coletiva gera movimento

O sindicato faz um apelo direto à categoria para que se engaje na luta. A mensagem é clara: a mudança depende da união. “Ninguém vai mudar essa lógica no nosso lugar. Se nós, servidores e servidoras, não estivermos juntos, o Judiciário vai continuar priorizando metas e selos, e não pessoas”, afirma Jaqueline.

A campanha pela jornada de 6 horas deve ser intensificada pelo sindicato nos próximos meses, com assembleias, debates e ações de mobilização para conscientizar a categoria sobre os benefícios da proposta. “Quando estamos sozinhos, a pressão adoece e sufoca. Quando estamos juntos, a pressão se transforma em movimento. Esta luta é por dignidade no nosso trabalho e por um Judiciário mais humano para todos que buscam justiça.” – insiste a diretora do SINJUSC.

Esta redução pode ser construída de maneira processual. Um primeiro passo está em fixar os marcos que indiquem o início e o fim da jornada que vem sendo desregulamenta na realidade do trabalho híbrido – presencial/virtual. O debate sobre o direito ao desligamento também deve ser priorizado neste momento.

* A servidora preferiu não se identificar

** A servidora preferiu não se identificar 

3 comentários

  1. A jornada de 6 horas já existe em vários outros tribunais, bancos e prefeituras. Seria interessante registrar todos os demais tribunais que já a possuem (ex.: TJPE, TJMT e outros) para apresentar à administração. No nosso caso, seria plenamente possível implementar o modelo do TJMT, no qual o expediente ao público é das 12 às 19, porém parte do efetivo atua das 12 às 18 e outra parte das 13 às 19, conforme Resolução 18 de 2014 daquele tribunal.

    • Boa ideia, temos que prosseguir nessa ideia! Muitos já trabalham 06 horas ou menos faz tempo. Com organização e responsabilidade tudo pode dar certo!

  2. Parabéns Sinjusc, pela iniciativa e pelo estudo através de depoimentos reais. Realmente, a tecnologia veio para ajudar, acelerar os trâmites processuais, mas também trouxe um cansaço mental e físico (principalmente para a visão) aos servidores. Lá em 2004/2005 havia uma carga horária de 06 horas/dia (13:00h às 19:00h) e dava tudo certo, ninguém reclamava. Por que não fazer isso agora que temos muito mais tecnologia e muito mais unidades/cartórios em funcionamento para dar conta da demanda?

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