“Não teve uma legislação aprovada que diga que melhorou a vida dos trabalhadores”, afirma Jucélia Vargas, palestrante do 9º Congresso do SINJUSC

A vice-presidenta da ONG Mulheres Negras Professora Maura Martins Vicência (MUNMVI) e integrante do Comitê de Combate ao Racismo e Xenofobia da Internacional do Serviços Público ISP, Jucélia Vargas Vieira de Jesus, é uma das palestrantes confirmadas para o 9º Congresso do SINJUSC, que acontece nos dias 26, 27 e 28 de maio, em Florianópolis. Ela faz debate no dia 27, a partir das 9h, na mesa “As políticas de austeridade e o futuro do serviço público brasileiro“. Com exclusividade, o Núcleo de Comunicação do SINJUSC entrevistou a profissional. Confira:

1. Com a ascensão do conservadorismo nos últimos anos, qual o principal desafio do movimento negro e de mulheres no Brasil?

O nosso maior desafio é realmente garantir política pública de inclusão social, pois houve o aumento da morte de jovens negros. As mulheres negras ocupam hoje os piores lugares ou até no desemprego? Elas são mulheres negras? São maioria. Na questão do serviço terceirizado, as mulheres negras, elas são as que estão no serviço terceirizado.

As mulheres negras são as mais violentadas. Enfim, os piores espaços estatisticamente são ocupados por mulheres negras e, segundo, por homens negros. Então, o grande desafio nesse momento é a questão das práticas de racismo, de homofobia e de machismo contra as mulheres.

Então, nosso maior desafio é, primeiro, fazer enfrentamento com a humanidade no sentido de combate ao machismo, ao racismo, a homofobia que diariamente matam as mulheres, negros e negras e LGBTs. 

Então, com o aumento do conservadorismo, as pessoas parecem que perderam o medo de cometer práticas realmente racistas. A gente tem assistido diariamente cenas brutais de violência entre jovens e homens. Em qualquer momento, em qualquer lugar e infelizmente a gente não tem um Judiciário que possa combater esse tipo de prática.

2. Você acha que a luta sindical e a chamada luta identitária se conectam? Se sim, como? Se não, por quê?

Na verdade, o movimento sindical ainda não assumiu essa pauta de fato. São poucas pautas em que a gente vê a questão identitária como pauta de negociação coletiva e de garantia. Infelizmente, quando o trabalhador ou a trabalhadora sai de seu trabalho, ele se dá conta de que lá fora existe todo um debate na sociedade e uma discriminação. Ele ainda não se conectou a uma pauta que vai para além de melhorar a condição de trabalho e melhorar salário. Desenvolvimento humano. Olhar de uma sociedade de igualdade, de oportunidades e que, para isso, o movimento sindical precisa compreender que na transversalidade essas pautas são fundamentais. 

3. Quais os principais retrocessos da luta sindical da eleição de Bolsonaro para cá?

O retrocesso é grande. A maior delas foi a questão da aprovação da Emenda Constitucional 95, de congelar investimentos públicos pelos próximos 20 anos. É uma emenda para matar gente, porque se nascem crianças todos os dias, elas vão precisar de vacina, de médico e creche. Como não tem investimento pesado para essa criança como ela vai ser atendida?

Tivemos a aprovação da reforma da Previdência, que as pessoas vão ter que trabalhar muito mais, se aposentar com valor muito menor. As pessoas têm que trabalhar jornadas intensas para ter um mínimo de uma condição salarial. Então, o governo nos últimos anos fez tudo em nome do mercado, em nome dos grandes empresários e não em nome do povo.

Na mudança de governo, a gente tem de revogar muitas das questões que foram aprovadas e a tentativa de aprovar a PEC 32, que aí sim seria a destruição total do Estado, da política pública e da estabilidade. 

Mas o retrocesso foi grande em todos os sentidos, na educação, nas políticas sociais, na questão do avanço, nas políticas de combate ao racismo, nos avanços das políticas para a questão da agricultura familiar, da terra, da territorialidade, na questão dos quilombos e das terras indígenas.

4. Houve avanços? Quais?

Não teve uma legislação aprovada que diga que melhorou a vida dos trabalhadores. Nós hoje estamos lutando para manter o direito que a gente tem, para não perder e para recuperar o que a gente perdeu. Isso é realidade em todas as categorias e no serviço público, então é cruel.

O serviço público foi escolhido para pagar a conta de toda a crise da pandemia. Então, eu não vejo nenhum tipo de avanço nesse governo.

5. O tema do 9º Congresso do Sinjusc é “Esperança é verbo”, um chamado para a ação, visto que verbo é ação. Como você vê a ação sindical em tempos de redes sociais e no pós-pandemia?

O tema vem num momento muito importante. Na história do Brasil, por muitos momentos, somos chamados para lutas e desafios para aqueles que se indignam e não aceita o momento atual de escravidão e exploração. Todos nós estamos vivendo um período de grande desafio como em períodos da escravidão e ditadura. Essa frase coloca pra nós de que é possível sair desse momento para um outro e construir um mundo possível. As ações precisam ser tomadas hoje. É preciso organizar o movimento sindical. Precisamos ter mais traquejo com os artifícios da comunicação digital pra que possamos nos comunicar melhor com a nossa categoria. 

6. Quando se fala em reforma no Brasil, geralmente se trata da flexibilização de direitos e garantias conquistados pelos trabalhadores. Como você vê a reforma da previdência implementada pelo atual governo federal?

Sempre que tem uma crise ou que se falta dinheiro é visto onde está sendo gasto e a previdência serviu como uma moeda de troca. O Governo Federal usou essa informação de que precisava fazer essa reforma pra que sobrasse dinheiro para outras áreas. O governo mentiu descaradamente. A reforma aconteceu e ela não trouxe e nem irá trazer melhorias em outras áreas, muito pelo contrário. As pessoas estão perdendo a esperança de se aposentar. Que tipo de produção se irá ter nessa relação capital e trabalho? A Reforma da Previdência é uma falácia com uma promessa de que sobraria dinheiro. Vimos, por exemplo, o que aconteceu no Chile, pois lá eles tiveram que voltar pois as pessoas estavam morrendo. É o que deve acontecer no Brasil. 

7. O governo estadual de Carlos Moisés também fez uma reforma da previdência. Você acha que essas reformas se conectam de alguma forma? Se sim, como? Se não, por quê?

O governo atual de Santa Catarina e também nos últimos anos tem ido na linha de quem prefere a privatização e a concentração de renda. Em uma linha desumana. Eles estão conectados nesse formato de não investirem em um Estado forte. Eles estão em uma linha de oferta do serviço privado tendo lucro com o dinheiro público. O governo de Carlos Moisés segue na mesma linha do Governo Federal. 

8. Qual a sua avaliação sobre a vitoriosa campanha dos servidores públicos contra a Reforma Administrativa (PEC 32)?

Nós conseguimos com a nossa unidade colocar na ordem do dia um olhar sobre esse governo federal e na luta contra a PEC 32. Conseguimos levar informação a todos e o debate sobre o serviço público. Para mim, foi uma grande vitória derrotar essa PEC que era da morte e que acabava com serviço público. A população seria a maior prejudicada. Serviço público é o patrimônio de quem não tem patrimônio algum. É a garantia de o mínimo de dignidade humana e precisa ser preservado por todos e todas. A nossa luta unificada gerou que a PEC não entrou em pauta em 2021 e também em 2022. 

9. Um debate que tem crescido no Brasil, sobretudo na academia, trata dos efeitos da jornada laboral sobre a saúde mental dos trabalhadores. Que debate tem sido feito em relação a essa questão dentro da estrutura sindical brasileira e quais as principais respostas apontadas?

Uma das grandes esperanças, mas ainda tá muito longe do nosso movimento sindical, infelizmente! Temos exemplos de países que os índices de suicídios são altíssimos pela exigência do grau de comprometimento individual. Aqui no Brasil, nós temos tido em algumas categorias o aumento do adoecimento mental e em questões de tentativas de suicídio, com relação a meritocracia e das metas a serem alcançadas. Essas coisas colocam como se o trabalhador fosse responsável em garantir mais recursos e mais salários. Nós temos condições sociais que precisam ser respeitadas e isso tudo influencia na vida das pessoas. Precisamos colocar o combate ao suicídio como política de governo. 

10. Ainda dentro do tema do Congresso que trata de esperança e ação. Na sua opinião, que ações precisam ser feitas para que o movimento sindical tenha esperança no futuro?

Uma das grandes esperanças é que seguimos vivos e precisamos olhar para o passado, para lembramos que cada direito nosso tem cheiro de suor nosso e não foi dado por ninguém. Nós construímos: com luta, garra e coragem! Quem luta pode até perder, mas quem não luta perde sempre. É na organização que a gente faz história. Nós dirigentes sindicais não temos o direito de perder a esperança, pelo contrário, a partir dela seguimos na construção de pautas que nos leve a tirar governos ditadores e que não representam o povo.

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