ARTIGO
Mateus Graoske Mendes
Psicólogo – CRP 12/12266
No dia de ontem, 6 de Agosto de 2019, estive com o secretário-geral Neto Puerta nos Fóruns das comarcas de Chapecó e Xanxerê debatendo a campanha “Violência moral no trabalho – lançar luz, organizar e combater”, além de outros assuntos pertinentes à categoria de trabalhadores e trabalhadoras do Poder Judiciário de SC, como o plantão judicial e reajuste no auxílio-alimentação.
Quando abordo o tema sobre a violência moral no trabalho gosto sempre de tratar das formas institucionais de violência moral que muitas vezes são veladas ou revestidas de legalidade, como resoluções ou portarias que impõem situações desconfortáveis e muitas vezes desnecessárias aos trabalhadores, bem como a imposição de metas impossíveis de serem cumpridas, as quais geram enorme sobrecarga de trabalho e frustração do trabalhador que se sente incapacitado perante este tipo de gestão, muitas vezes perversa, que desconsidera as singularidades de cada sujeito, de cada local de trabalho e, em nome da máxima produtividade, cria um ambiente de competitividade, individualismo e, é claro, de adoecimento físico e mental.
Para além disso, outra forma de violência moral no trabalho é a degradação e precarização das ferramentas de trabalho. Se em um determinado local de trabalho se faz necessário o uso de 10 computadores para o bom desempenho das atividades de labor e 5 destas máquinas estiverem com defeito ou estragadas, significa que metade dos trabalhadores deste local terão que dedicar o dobro de sua força de trabalho para cumprirem suas tarefas e suprir a falta dos equipamentos, sem contar a sobrecarga já instalada pela falta de trabalhadores necessários.
Cadeiras e mesas mal dispostas, a falta de ergonomia, protetores de tela e todo um conjunto de materiais que se degradados, em falta ou precarizados, irão levar, muito provavelmente os trabalhadores ao adoecimento.
Enquanto nós tratávamos destes temas, falávamos também da precarização dos softwares, que muitas vezes surgem como a solução de todos os problemas e que um mau funcionamento pode causar os mais diversos transtornos tanto para quem está trabalhando como para aqueles que dependem do resultado deste trabalho. Fiz um pequeno exercício de reflexão com os servidores: “Imaginem vocês, um sistema digital que trava com bastante frequência fazendo com que o seu trabalho atrase.
Naquele momento, provavelmente você ficará bastante irritado, como de praxe acontece quando nossos aparelhos não funcionam da forma com que esperamos. Essa irritação causa um desgaste psicológico, mesmo que pequeno, mas um mal-estar que pode provocar uma mudança de humor durante algumas horas. Agora imaginem este mal-estar repetidas vezes durante o dia durante longos anos de trabalho”. Isso não passa sem efeitos para nossa saúde mental.
Hoje a grande parte dos afastamentos de saúde são em decorrência de transtornos psicológicos como a depressão, síndrome do pânico e síndrome de Burnout. O esgotamento mental do trabalhador se dá em um longo processo de desgaste psicológico em decorrência do trabalho.
Interessante que enquanto eu falava isto os trabalhadores se olhavam e balançavam a cabeça de forma afirmativa, como quem se dá por conta da precarização das condições de trabalhos às quais está submetido diariamente, e, naquele exato momento o SAJ estava parado. Não só em Chapecó e Xanxerê, mas em todo o Estado de Santa Catarina. Naquele momento, cerca de 7 mil trabalhadores e trabalhadoras do Poder Judiciário do Estado estavam diante de seus computadores, sua principal ferramenta de trabalho sem poder fazer nada, pois o software travou.
No dia seguinte de trabalho, antes de começar as suas tarefas terão que dar conta do trabalho do dia anterior que ficou parado e acumulou. Nada poderia ter sido mais ilustrativo naquele momento em que falávamos sobre a precarização das condições de trabalho. Por mais que os sistemas digitais existam para trazer mais agilidade, eles necessitam da mão humana para funcionar. Se tivermos os melhores softwares e não tivermos trabalhadores suficientes, metas absurdas, haverá sobrecarga e acúmulo de trabalho.
Se tivermos os melhores softwares, mas computadores antigos ou com defeitos, a máquina vai travar, o trabalho também vai acumular e os trabalhadores irão adoecer. É necessário que todo um conjunto de materiais (pessoas, softwares, hardwares, mobiliário, EPI’s) seja disposto de forma a proporcionar as condições para um ambiente saudável de trabalho.
Sem isso, qualquer sistema digital que venha com a promessa de ser uma “panaceia”, a cura para todos os males, vai falhar e quem irá carregar os prejuízos disto serão os trabalhadores e trabalhadoras no seu labor diário para prestar um serviço público de qualidade para a população, que quando não acontece é fruto da degradação e da precarização das condições de trabalho.
Uma última observação: sabemos que estas falhas do sistema em nível estadual não é uma raridade. A vinda do E-proc traz a mesma promessa que o SAJ trouxe. Mas é importante ter em mente que a migração para o E-proc não exclui o adoecimento já criado (e cultivado) pelo SAJ.