Estado doa R$ 5 bi pra empresas, e não tem dinheiro pra trabalhador

O Governo de Santa Catarina vai deixar de arrecadar R$ 5,5 bilhões de reais em 2018 somente em isenções fiscais. Todo esse recurso poderia melhorar a saúde, a educação, a segurança e o transporte públicos, e também os salários dos/as trabalhadores/as do Executivo, Legislativo e Judiciário. Mas não dá. Esse é um dinheiro que não existe porque o governante de plantão abriu mão de cobrá-lo. Alega que se não fizer isto, empresas se mudariam para outros Estados.

Além das concessões de renúncia serem no mínimo questionáveis, ainda impressiona o volume de recursos que o governo abre mão de arrecadar: é mais do que foi gasto ano passado com educação (R$ 3,4 bilhões), saúde (R$ 3 bilhões) e segurança pública (R$ 2,6 bilhões). As renúncias fiscais oneram tanto os cofres públicos que entre 2% e 4% do valor renunciado já financiaria os pleitos da categoria, como um PCS que resolvesse as disfunções e o nível superior para os técnicos, por exemplo.

As isenções fiscais são buracos negros de todos os Poderes Executivos. Tanto que em Santa Catarina, num recente acordo entre o Governo e o Tribunal de Contas do Estado, testemunhado apenas por eles, o primeiro ficou de abastecer o segundo com dados sobre os setores beneficiados pela renúncia fiscal. O sigilo, porém, terá que ser mantido. Quer dizer, aquela tal Lei da Transparência não vale quando os governos do Estado e Federal dão uma ajudinha para determinados setores empresariais, mesmo que fiscalizados pelos Tribunais de Contas.

Pode ser que este zelo em ocultar os beneficiários acabe. É um pouco difícil com as atuais regras da República e com o desequilíbrio que há entre os poderes. No caminho de abrir o quase eterno cofre sem chave que é a renúncia fiscal, o Senado Federal debate o assunto e poderá pôr um fim a esse sigilo constrangedor. O Plenário do Senado pode concluir em breve a votação do projeto que obriga a publicação do nome dos beneficiados (PLS 188/2014). O texto principal foi aprovado no último dia 12 de junho, mas os partidos governistas entraram em obstrução para adiar a votação de uma emenda.

O texto original autoriza a Receita Federal a tornar públicos os nomes de pessoas e empresas beneficiadas por renúncia fiscal. A emenda de Lúcia Vânia, relatora do projeto na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), propõe a divulgação apenas dos nomes de pessoas jurídicas. A liderança do governo defende a tese da senadora Lúcia Vânia. E a coisa toda parou e só vai andar se os partidos que querem a quebra total do sigilo cederem às pressões de manter sob segredo os nomes das pessoas físicas e de entidades beneficentes.

Como está desde 2014 nos escaninhos do Senado, pode ser que cidadãos e cidadãs mais comuns tenham que esperar ainda alguns anos até que todos/as possam saber quem são as empresas e pessoas físicas que recebem estes agrados e o porquê, além das alegações meramente oficiais que constam na lei.

Caso o Senado aspire a fumaça do bom Direito, o acordo entre o Tribunal de Contas de Santa Catarina e o Poder Executivo cairá. Atualmente, o governo até declara, na Lei de Diretrizes Orçamentárias, alguns segmentos beneficiados, mas nem todos têm justificativas plausíveis. Das empresas de TV a cabo por assinatura, por exemplo, o Estado de Santa Catarina abre mão de cobrar R$ 104.476.764,97 somente em 2018. Por quê faz isso? Ninguém sabe!

Bem estranha é a regra para que o Governo catarinense se permita deixar de arrecadar R$ 40.676.433,46 do comércio varejista. Está lá, na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2018, aprovada pela Assembleia Legislativa sem nenhum debate neste quesito. Para deixar de pagar mais de 40 milhões de reais em impostos, os lojistas têm que vender… em prestações! Se ele cobrar na hora e com desconto para seus clientes, não poderá utilizar a renúncia fiscal. A ideia dos equipados burocratas do governo é quase insensata: se o lojista conseguir endividar seus clientes, no carnê, terá desconto do que deve ao Estado catarinense. Ou seja, além de se locupletar com juros astronômicos nas vendas na prestação ainda recebe um bônus governamental.

Outros dois segmentos, com as maiores vantagens ofertadas pelo Poder Executivo e sem nenhum  controle da população ou de quem quer que seja, são aqueles que produzem têxteis, vestuário, artefatos de couro e seus acessórios. Com este, deixam de entrar nos cofres públicos 1,1 bilhões de reais. Os empresários que abatem boi, aves e suínos também recebem uma ajudinha, de nada menos do que R$ 620.566.475,43. Ou seja, mais de 650 mil vezes o salário mínimo que entrará em vigor dia 1° de janeiro do ano que vem! Também recebe incentivo pela renúncia fiscal uma conta no mínimo suspeita, que chama “insumos agropecuários”. Insumo pode ser, e é com certeza, venenos utilizados na agricultura. Este segmento pode deixar de arrecadar até R$ 381.338.067,43 em 2018. É esta a política de Estado? Ao mesmo tempo em que se envenenam alimentos, a água e a terra, paga-se menos imposto!

No ano passado, as isenções concedidas pelo Governo do Estado chegaram a R$ 5,58 bilhões, e o governo prestou contas de apenas R$ 316,3 milhões. O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas se posicionou pela rejeição das contas e apontou que o Estado não pode conceder tantos benefícios ao mesmo tempo em que não cumpre as aplicações constitucionais em Educação e Saúde, uma vez que o volume de benefícios fiscais supera os investimentos nas duas áreas.

Se você ainda está se perguntando o que tem a ver com tudo isso, como trabalhador/a do Poder Judiciário, então perceba com maior atenção as notícias que saem a toda hora sobre a falência do Estado, ou a necessidade de contratar terceirizados e comissionados sem concurso no Poder Judiciário e no Legislativo, para economizar e demitir na hora que for mais conveniente.

O que todos têm a ver com a renúncia fiscal é o que se tem a ver também com qualquer recurso público: a falta de controle e transparência e participação das pessoas na distribuição e uso desses recursos. Ninguém deve ser calar diante de um Estado que abre mão de R$ 5,5 bilhões. Até porque boa parte desse recurso poderia melhorar a carreira dos/as trabalhadores/as do Poder Judiciário.

Um comentário

  1. Sugiro que esse texto permaneça no site por longa data. Aliás, como forma de contribuição do Sindicato e dos servidores, em respeito à sociedade e à manutenção da coisa pública, fazer intensos debates sobre o assunto. Debater com outras categorias e seus sindicatos, tornando pública tal informação é imprescindível. Talvez um vídeo no YouTube.

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