Para dizer que não falei das “greves”

O SINJUSC não deflagrou uma greve. Se assim o tivesse feito, haveria no site, nas redes sociais e no WhatsApp convites para reuniões e lives sobre o tema, materiais diversos de mobilização e convocação para uma Assembleia. Uma olhada rápida em nossos canais já sanaria esta dúvida.

O SINJUSC não deflagrou uma greve, mas teria toda a legitimidade para fazê-lo.  O direito à greve é garantido constitucionalmente, um instrumento de luta na defesa da dignidade dos trabalhadores. O Estado Democrático de Direito, mesma estrutura que assegura a existência do Judiciário e da OAB, também tem como preocupação o estabelecimento de justas relações de trabalho. Só para confirmar, o Brasil ainda é um Estado Democrático de Direito.

Está evidente nas matérias do SINJUSC que o enunciado de greve representa um recurso de linguagem para demarcar que o sindicato utilizará todos os meios necessários para assegurar que os trabalhadores não sejam expostos a condições sanitárias inadequadas. SE houver RISCO DE MORTE, faremos GREVE PELA VIDA. Não é esse o dever do sindicato, defender os trabalhadores?

Para aqueles que ainda estão se perguntando se tal recurso retórico era, de fato, necessário, vamos a um breve compilado. Com a demissão dos trabalhadores terceirizados, as atividades de limpeza dos fóruns foram completamente comprometidas – até mesmo porque não devia haver pessoas trabalhando presencialmente. Acontece que muitos servidores foram obrigados a montar escalas de rodízio nos cartórios ou optaram fazê-lo por conta própria em busca de melhores condições para executar as atividades.

Contudo, nós estamos em contexto de pandemia e estas não podem ser decisões individuais. A Direção do TJSC preferiu vendar os olhos frente ao que estava acontecendo. O resultado é que servidores contaminados estavam trabalhando nas dependências dos fóruns junto com outros colegas sem qualquer protocolo de higienização cotidiana dos espaços – pois, em teoria, os fóruns deveriam estar fechados.

Havendo conhecimento das contaminações e sem protocolos institucionais, não houve isolamento dos trabalhadores que conviveram com os colegas contaminados, não houve testagem, não houve descontaminação nos ambientes. Lages não é um caso isolado.

O SINJUSC buscou a Direção do TJSC para relatar tais situações e a resposta recebida foi que havia uma Resolução e, por isso, tais situações certamente não estavam acontecendo. Simples assim. A última conversa que tivemos com a direção do TJSC foi no dia 06/08/2020.

Depois disso, saiu um Ofício-circular e um vídeo de WhatsApp pedindo que as pessoas fossem aos fóruns apenas em situações essenciais – ou seja, a Direção do TJSC sabe que as pessoas continuam indo aos fóruns sem que haja condições sanitárias para isso. O SINJUSC não teve qualquer resposta oficial, nem houve publicação no site sobre o tema.

Se tal realidade fosse observada em um supermercado ou em uma farmácia, serviços essenciais com os quais a OAB fez questão de nos identificar em sua manifestação, certamente o estabelecimento seria fechado. A descontaminação do ambiente e a testagem e isolamentos dos funcionários seriam o mínimo esperado. Mas para os trabalhadores do Judiciário parece que pedir isso, condições mínimas, é muito.

O discurso de ataque ao serviço público logrou tamanho êxito que até mesmo os trabalhadores parecem tem comprado a ideia – Greve, o que a “sociedade” vai falar de nós? A sociedade tem falado coisas horríveis de nós, talvez, por isso, esteja na hora de nós, também, falarmos algumas coisas para a “sociedade”. A tão denunciada ineficiência do Judiciário é fruto da falta de trabalhadores e não de um “parasitismo” nosso com o Estado.

Muitos cartórios trabalham com número reduzido de pessoas e nestes casos os juízes não tem qualquer autonomia para completar suas equipes de trabalho – para que mais servidores se temos metas?! A gestão pela exploração está na organização do trabalho por gratificações, na implementação de programas de cooperação e no recente lançado Fortalece. Ah, não podemos esquecer dos plantões: sete dias corridos, disponibilidade de 24 horas, zero remuneração adicional. A recompensa? Dois dias de folga com uma serie de entraves para serem gozados.

Também vale comentar que neste período de pandemia, apesar de todas as condições adversas, batemos recordes de produtividade sem qualquer investimento e com os trabalhadores assumindo as despesas pela execução do trabalho. Até agora, nenhuma informação sobre os valores economizados a custa do nosso trabalho e por meio da vilipendiação dos nossos direitos. Daqui a pouco vai ter empresário pedindo consultoria à Direção do TJSC. A nova modalidade de privilégio é o privilégio da exploração.            

O SINJUSC não deflagrou greve, mas essa não é a informação principal deste editorial. A informação principal para a sociedade é que nós entendemos a importância dos serviços prestados pelo Judiciário e estamos fazendo tudo o que está a nosso alcance para que os servidores estejam saudáveis e os espaços de trabalho adequados para o atendimento.

A informação principal para os servidores é que não é vergonha lutarmos por condições dignas de trabalho e exigirmos que os esforços empreendidos nestes meses sejam reconhecidos. Para a direção do TJSC e a OAB que se colocam como ofendidos, nós respondemos que frente a este cenário os ofendidos não são eles, somos nós os trabalhadores.

6 comentários

  1. Temos que nos preservar sim. Mais do que isso é combater o que chamo de “síndrome do capacho”, doença que atinge a consciência de muitos servidores da justiça. Apenas lembro que as jornadas serão extenuantes e muitos trabalhadores não estarão imunes aos problemas de saúde devido a carga psicológica e as reformas que ainda estão por vir.

  2. Parabéns ao Sinjusc por manter a palavra GREVE! Sindicato é para lutar e no interesse da categoria que representa. Cabe ao sindicato, portanto, manifestar o anseio da categoria e apresentar sua melhor arma, quando todas as outras não funcionam, a GREVE. É impressionante a força dessa palavra. Veja que bastou o Sindicato publicar editorial insinuando a possibilidade de dialogar com a categoria sobre o assunto, que já se gera polêmica e receio. Ora, a situação está tão terrível para o trabalhador que GREVE virou palavra esquecida da burguesia, pois não se fala mais nisso. Há um medo oriundo da alienação política do trabalhador de tal magnitude que quando os setores representantes da burguesia, ao ouvir ou ler tal palavra, GREVE, não acreditam que um sindicato teve a ousadia de usá-la. Acham absurdo, pois já tem como certo de que GREVE é palavra censurada, proibida e caída no esquecimento da classe trabalhadora. É momento, prezados, de reforçar essa palavra, mas não em abstrato. Deve-se colocá-la na pauta, pois é a palavra que o patrão entende.

    • Excelentes colocacões, colegas. Ao que se pode observar, realmente, os servidores do Judiciário parecem acometidos da “síndrome do capacho”. Temeráriamente avançam cegos em direção à bocarra do tubarão que irá abocanhá-los. Cabe lembrar que , historicamente, há um momento em que é imprescindível posicionar-se contra qualquer tentativa de deslegitimação de direitos. Ou arcar com as consequências da sua omissão.

  3. Pior é saber que situações como a de Lages continuarão a acontecer. É só dar uma passadinhas nos fóruns e ver quanto juiz obrigando os servidores a trabalhar sem nenhuma condição sanitária, mesmo com o home office “garantido”.

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